Entrevista autora “O Ratinho e o Violão”
Por que decidiu abordar o bullying no seu segundo livro infantojuvenil? O Chiquinho foi inspirado em alguém que você conhece?
Leciono há mais de vinte anos, para adolescentes entre onze e quinze anos. Como se sabe, esta é a idade mais difícil, já que são muitas as mudanças pelas quais estes meninos e meninas estão passando. A prática do bullying costuma ser muito acentuada nesta idade. Eu sempre trabalhei valores como ética, respeito ao outro e a cultura da paz entre todos. Este livro, no caso, aborda também a inclusão, pois o personagem sofre bullying por mancar de uma perna. E, sutilmente, deixa uma pista sobre a necessidade de escolas que se preocupem com a acessibilidade. Chiquinho tem dificuldade de locomoção e, para ir para a sala de aula, tinha que subir uma escada. Pense bem: se fosse uma escola melhor adaptada, teria uma rampa para alunos iguais a ele, ou então, uma sala no andar de baixo. A história não foi baseada em um caso específico, mas em várias situações que presencio todos os dias em escolas: as questões do bullying e da inclusão.
Mas confesso que levemente fiz uma alusão ao livro A Metamorfose, de Kafka. Este livro é um clássico universal, cujo personagem passa por uma situação de grande opressão e vira uma barata, que se confina num quarto e vira motivo de vergonha para a família. Uma história pesada – ele morre barata. Em O Ratinho do Violão, Chiquinho por vergonha e medo, após cair de uma escada na escola e ser vaiado, vira um ratinho e vai morar dentro de seu violão. Após passar muito apuro, ele consegue dar uma reviravolta em sua vida… Bem, ele tinha um violão e a música – elementos fundamentais para lhe dar autoconfiança e nosso personagem voltar à forma humana.
Como professora, já presenciou algum caso de bullying grave na escola? Como foi?
Não presenciei um, porém vários. E um caso que me chamou atenção em específico foi em uma escola de periferia muito violenta onde leciono há muitos anos. Um grupo de alunas que só ia à escola para tumultuar, não para estudar, começou a perseguir as meninas mais estudiosas e bonitas da escola. Ameaçavam bater, colocavam apelido e as perseguiam mesmo. A situação ficou séria demais, ao ponto dos pais das boas alunas desejarem tirar as filhas de nossa escola. A direção precisou tomar uma postura firme, convocar os pais e o Conselho Tutelar, registrar ocorrências. A custo, conseguimos selar um acordo de convivência pacífica. Foi um caso bem difícil, mas conseguimos!
Na sua opinião, como pais e professores devem conduzir os casos de bullying?
É papel da família e da escola transmitir valores em geral. Precisamos educar para a vida e nos preocupar em formar pessoas de bem. A melhor estratégia para abordar o assunto em questão é o diálogo, além de leituras e muita reflexão. Ainda é necessário deixar bem claro para os estudantes que bullying é crime previsto em lei e pode levar a sérias consequências, inclusive para os pais daqueles que o praticam. Família e escola devem ser parceiras sempre – só assim o processo educacional obtém êxito.
O bullying é um fenômeno que só ocorre nas escolas?
Infelizmente esta prática ocorre em todo lugar. Costuma iniciar com brincadeiras bobas, gozações… Mas, tudo tem uma hora para parar. Qualquer situação em que um dos lados se sinta ofendido, é considerado caso de bullying.
Acredita que o bullying é um fenômeno moderno?
Não, a prática do bullying sempre ocorreu em todas as épocas. Mas nem se ouvia falar neste nome, já que ele é de origem inglesa e há bem pouco tempo se tornou frequente. Recentes são os estudos específicos sobre o assunto e os prejuízos emocionais que isto causa naquele que sofre esta prática.
Como o seu livro pode ajudar a combater o bullying?
Conforme disse, O Ratinho do Violão aborda temas como: bullying, medo, inclusão. É um texto bastante sensível, lúdico, envolvendo o leitor na trama psicológica vivida pelo personagem. Este livro, ilustrado pela Thais Linhares, tem leitores de um público diverso, e emociona crianças e adultos. Educadores o elogiam bastante. Penso que o livro pode ajudar na formação de pessoas mais conscientes que saibam tratar o outro com mais respeito e generosidade. Afinal de contas, respeito e generosidade são pilares fundamentais para a construção de uma sociedade melhor e mais justa para todos.