Universo, uma história de erros. Texto de Hélio Schwartsman
Com algum atraso, comento o livro “Criação Imperfeita”, do físico Marcelo Gleiser, lançado em março último. Gostei bastante. É uma obra de receita improvável: junte uma competente revisão da física de partículas com um panorama dos últimos trabalhos em cosmologia e salpique um pouco do que já se publicou sobre a origem da vida; acrescente à mistura um tom memorialista e extraia deliciosas conclusões epistemológicas, que, se não questionam a base da ciência ocidental, pelo menos lançam novos “insights” sobre as motivações dos que a escreveram e o tipo de busca em que se enredaram.
Como sou menos do que um aprendiz em física e biologia, não me aventuro muito nessa seara. Só o que posso dizer é que Gleiser, como bom professor –atualmente, ele dá aulas no Dartmouth College, em New Hampshire (EUA)–, é quase claro em suas explicações. Ao ler seus esclarecimentos sobre bárions, léptons e supercordas, ficamos com a sensação, certamente enganosa, de ter compreendido tudo.
Deixemos, entretanto, os quarks e bósons para os físicos. O que me interessa discutir aqui é a filosofia da ciência por trás do livro. A tese central de Gleiser é que, desde os primeiros filósofos gregos, sempre foi a busca por princípios de unificação e simetria que inspirou os cientistas. Desvendar o mundo equivalia a descobrir a ordem matemática por trás das coisas. “A matemática é o alfabeto no qual Deus escreveu o universo”, disse certa vez Galileu Galilei. E o astrônomo de Pisa não foi o primeiro nem o último a tentar ler o divino na ordem natural. A tradição, com efeito, remonta aos gregos –especialmente os pitagóricos e a Platão–, mas prosperou, ecoando até mesmo em Einstein, para quem “o Senhor não joga dados”.
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Hélio Schwartsman : É editorialista da Folha de S. Paulo. Bacharel em filosofia, publicou “Aquilae Titicans – O Segredo de Avicena – Uma Aventura no Afeganistão” em 2001, pela Geração. Escreve para a Folha Online às quintas.